Roma | M2










Os poderes imperiais





Um ano antes da sua morte, Augusto fez elaborar o relato dos seus feitos que, conforme a sua vontade explícita, deveria ser gravado em placas de bronze e colocado à entrada do imponente mausoléu que ele próprio erigira no Campo de Marte, para lhe servir de túmulo. Estas inscrições de bronze perderam-se mas, felizmente, o seu sucessor, Tibério, mandou fazer várias cópias que espalhou pelo império. Em Ancara, na actual Turquia, encontra-se o único exemplar que sobreviveu. Alcancei duas vezes a ovação e três o triunfo curul, (honras prestadas aos generais vitoriosos) e vinte e uma vezes fui proclamado imperador (...) fui princípe do Senado (princeps senatus) (...) fui pontífice máximo (...).




Uma lei determinou (23 a.C.) que a minha pessoa seria, para sempre, inviolável e possuiria o poder dos tribunos da plebe (...). No meu sexto e sétimo consulados (28/27 a.C.), depois de ter extinguido a guerra civil, e de ter assumido, por consenso universal, o poder supremo, passei a República do meu poder para o arbítrio do Senado e do Povo Romano. Por esse motivo, e para me honrar, recebi o título de Augustus, por decisão do Senado, (...) e colocado na Cúria Júlia um escudo de ouro, que testemunhava (...) que o Senado e Povo Romano mo concediam devido à minha valentia, clemência, justiça e piedade. Depois dessa época, fiquei acima de todos em autoridade (...)




Eu estava eu no meu décimo terceiro consulado (2 a.C) quando o Senado e o Povo Romano inteiro me designaram Pai da Pátria (...)




Quando escrevi estas coisas estava no septuagésimo sexto ano da minha vida (13 d.C.).
Feitos do divino Augusto, inscrição de Ancara



O pragmatismo romano
A prudência romana empregou-se principalmente em coisas que pouca atenção receberam dos Gregos – pavimentação das estradas, construção de aquedutos e esgotos. De facto, os Romanos calcetam as estradas abertas através de montes e vales, a fim de as mercadorias poderem ser transportadas em carros desde os portos. Os esgotos, feitos de pesadas pedras, são tão largos, em alguns lugares, que podem passar sobre eles os carros carregados. O fornecimento de água por meio de aquedutos é tão abundante, que pode dizer-se que os rios correm para as cidades, e quase todas as cidades, providas de canalizações, possuem fontes.




Estrabão, Geógrafo e Historiador (C. 64 a.C. e c.24 d.C.) Geografia II, 4-

A fundação de Roma




Diz a lenda que Roma foi fundada, no ano 753 a.C., por Rómulo, um dos gémeos que a sacerdotisa Reia Sílvia concebera de Marte, deus da guerra. Este, juntamente com o seu irmão Remo, foi abandonado nas margens do rio Tibre. Os dois foram miraculosamente salvos por uma loba, Capitolina, que os amamentou. Mais tarde, desavenças entre os irmãos, levaram Rómulo a assassinar Remo.




Na realidade Roma nasceu como qualquer outra cidade, de um pequeno povoado que, favorecido pela geografia e pela história, se foi engrandecendo.




A cultura romana estava intimamente ligada à cidade, entendida, tal como na Grécia, não como um simples conjunto de edifícios, mas como uma associação destinada a satisfazer hábitos, necessidades e interesses comuns aos que nela habitavam. Para além disso, os Romanos consideravam as cidades como células ideias de administração, já que nelas se concentravam as instituições governativas.



Assim se entende que uma das primeiras tarefas, após a conquista, fosse a reorganização ou a criação de centros urbanos: em regiões como a Grécia, onde o sistema de cidades já era antigo, os Romanos souberam respeitar a sua forma de funcionamento limitando-se a introduzir pequenas alterações, noutros locais, como a Gália ou a Península Ibérica, onde as cidades eram raras ou mesmo inexistentes, os Romanos apressaram-se a criá-las proporcionando-lhes as condições necessárias ao seu desenvolvimento.




Deste modo, o Império Romano era um mundo de cidades dotadas de relativa autonomia, capazes de resolver localmente muitos dos seus problemas. E era sobre este espaço urbanizado que Roma estendia o seu domínio, impondo-se como modelo a seguir. Roma era a urbe por excelência, o centro do poder, o coração do Império.





As Instituições políticas durante a Monarquia e a República




Apesar do Império estar espalhado por diversas zonas da actual Europa, Ásia e África, existia um poder centralizado em Roma. Nesta cidade vigoravam, desde o tempo da Monarquia, três instituições que comandavam os destinos do Império: o Senado, as Magistraturas e os Comícios.




O Senado (assembleia) foi a instituição política mais velha do Estado Romano, tendo sido criado pelo primeiro rei de Roma, Rómulo, só desapareceu no fim do período designado por Império, em 476 d.C.. Ao longo da história de Roma, foi nesta instituição, onde o uso da palavra e da retórica eram uma arma de sucesso para a condução das discussões e das votações, que muitas decisões foram tomadas. Por esse motivo, os senadores deveriam ter uma cultura vasta e um bom domínio da língua latina e do direito romano. Pelo perfil exigido, só os cidadãos melhor preparados é que podiam almejar vir a ocupar um lugar nesta Instituição, o que justifica o facto de na sua esmagadora maioria, ser quase exclusivamente composto por grandes latifundiários de origem Patrícia, ou seja, nobre.



Durante o período da Monarquia, esta instituição possuía apenas um carácter consultivo, onde se reuniam os anciães (os mais velhos). Era um órgão de consulta, que funcionaria nos seguintes moldes – quando um oficial, por exemplo, decidia declarar guerra a um Estado inimigo, recorria a esta Instituição para escutar a sua opinião.




Contudo, durante o período da República, o Senado passou a deter funções muito mais vastas, passou a controlar o Tesouro Público, a administrar as Províncias, a validar as leis aprovadas nos Comícios, a comandar a Política Externa e a controlar a actuação das Magistraturas. No fundo, o poder passou a residir todo nas suas mãos. Às Magistraturas cabiam funções menos relevantes, estas podiam ser de natureza administrativa, judiciária ou militar. Por fim, os Comícios eram assembleias periódicas de carácter popular, as Instituições menos importantes na gestão romana, constituídos por elementos da Plebe, isto é, do povo.




A gestão do Império – um mundo de cidades


Embora as cidades constituíssem centros administrativos capazes de gerir os assuntos correntes, o Império funcionava como um estado centralizado, sujeita à autoridade máxima de Roma. A sua grande extensão exigia um poder forte e eficiente, capaz de salvaguardar a ordem e as Províncias. Perto do final do século I a.C., Roma mergulhou num período de grande agitação social e política que desembocou numa guerra civil e na anarquia. Vários “partidos” e personagens da vida política romana procuraram ocupar o poder e centralizá-lo nas suas mãos. Júlio César, antes de ter sido assassinado no Senado por Brutus, tentou destruir a República e instaurar, sem sucesso, um regime ditatorial. Na sequência da morte de Júlio César, Octávio saltou para a ribalta política, com apenas 19 anos.




Segundo os seus biógrafos (Seutónio e Tácito) era na ocasião, um jovem tímido, modesto e sem grande presença física, com uma saúde precária e sem gosto nem jeito para a carreira militar. No entanto revelou-se, pouca a pouco, de uma extrema habilidade e de grande competência e eficiência políticas. Com prudência e diplomacia, soube granjear os apoios necessários, afastar os seus rivais e tornar-se de tal modo indispensável perante o Senado e o povo romano que estes o foram cumulando de poderes que acabaram por fazer dele a primeira figura do Estado romano.



Com Octávio César Augusto, Roma alcançou o seu maior esplendor, a época de ouro da Civilização Romana. O Imperador marcou de tal modo a sua época que após a sua morte, o Senado Romano apelidou o seu tempo de vida como o “Século de Augusto”.



Dotado de um extraordinário sentido político, Octávio chegou ao primeiro plano do Estado por delegação do povo romano, dentro da ordem republicana, e possuiu, de facto, uma autoridade pessoal, absoluta e de carácter quase divino, já que a aura de prestígio que o acompanhou originou o culto imperial, factor de propaganda e coesão políticas em todo o vasto Império Romano. A estas prerrogativas acrescentou ainda o direito de nomear ou designar sucessor (um filho ou, na falta deste, um sobrinho, um irmão, um protegido por adopção…), dando origem a que o poder imperial se tornasse dinástico.






A ÉPOCA DE OURO DO IMPÉRIO ROMANO



A ACÇÃO DE AUGUSTO MANIFESTOU-SE A VÁRIOS NÍVEIS:



No plano militar: restabeleceu a ordem e a disciplina após a anarquia e guerra civil dos últimos tempos da República; continuou as conquistas e pacificou as províncias, estendo sobre elas a pax (paz) romana. A pax romana era uma preocupação para os Romanos, quando as suas legiões conquistavam um determinado local, procuravam pacificá-lo, levando progressivamente para esse mesmo território as várias instituições romanas, o direito e a língua.



No plano político: empreendeu a reforma do aparelho administrativo central e provincial; no primeiro, reforçou os poderes do imperador, criando-lhe novos órgãos de apoio: (Conselho imperial, Guarda Pretoriana e novo corpo de funcionários dele dependente) e reduziu os poderes do Senado, das Magistraturas e dos Comícios. Na realidade, Octávio César Augusto reduziu consideravelmente os poderes das antigas Instituições Republicanas, apesar de as ter conservado, pois os cidadãos romanos estavam muito apegados à sua organização governativa.



No plano social: apaziguou as lutas sociais (paz social), reordenando a população com base na igualdade teórica perante a lei, para os cidadãos livres, e fazendo recair sobre o montante do imposto pago (o censo que Augusto tornou obrigatório) a possibilidade de ser eleito para os cargos públicos e políticos, como o Senado e as Magistraturas. Com estas medidas, o Imperador pretendia garantir a coesão do corpo social, mantendo-o fortemente hierarquizado a partir da cúpula, constituída por ele e pela sua família.



No plano cultural: o imperador, formado na tradição helenística e amante das letras e das artes, usou da prosperidade económica para proteger poetas, escritores, historiadores, intelectuais e artistas, atraindo-os à sua corte e subsidiando as suas obras (início do mecenatismo, actividade cujo nome advém precisamente de um dos mais fieis conselheiros de Augusto – Mecenas). Por outro lado, Octávio patrocinou numerosas obras públicas como estradas, pontes, aquedutos, termas…; muniu-se de arquitectos e artesãos gregos para reformar ou construir templos, teatros, mausoléus, arcos do triunfo… e rasgar um novo Fórum, a praça pública, (centro político, económico e religioso), o Forum Augustum, a ele dedicado; construiu e equipou bibliotecas públicas, fundou escolas.



Com tudo isto, Augusto não só conseguiu manter o império governado e unido, com a paz e a prosperidade, como criou, na sua pessoa e no aparelho central que dele dependia, uma espécie de identidade supra-regional capaz de integrar as diversidades geográficas, étnicas e culturais das terras conquistadas.



OCTÁVIO CÉSAR AUGUSTO (63 a.C – 14 d.C)



Primeiro imperador romano. O seu nome é Caio Júlio César Octaviano Augusto. É sobrinho e herdeiro de Júlio César. O seu pai, Caius Octavius, foi edil e pretor em Roma e, mais tarde procônsul, na Macedónia. A mãe, Átia, era sobrinha de Júlio César, e este, interessando-se pela carreira do sobrinho, deu-lhe uma educação aprimorada, adoptando-o como filho em testamento.




Após o assassinato de Júlio César (15 de Março de 44 a.C.), por um grupo de Senadores republicanos que desejavam devolver o poder ao Senado e viam em Júlio César um ditador estrangulador da velha instituição de Roma, Octávio apresentou-se na capital do Império disposto a cumprir o testamento de Júlio César. Designado cônsul, formou o segundo triunvirato (43 a.C) com Marco António e Lépido. Lutou contra Bruto e Cássio, que venceu em Filipos (42 a.C.), responsáveis pela conjura contra César. Depois de derrotarem os seus inimigos, Octávio Augusto e Marco António dividiram o Império: o Oriente para António e o Ocidente para Augusto. Porém, o antagonismo que existia entre ambos faz com que se declarasse novamente a guerra. A vitória naval de Octávio (31 a.C.), sobre as tropas de Marco António no Egipto, significou o regresso do Império Romano à unidade territorial.



A partir dai, sem rivais a enfrentar, Augusto fundou o Império Romano e pôde começar, com um talento político e organizativo impar, a dispor de novo as estruturas do império de tal modo que garantiu para si o controlo efectivo dos poderes essenciais ao mesmo tempo que mantinha as instituições republicanas. Na prática, significava dizer que Octávio manteve as antigas instituições republicanas: Senado, Magistraturas e Comícios, contudo, esvaziou-as de poder, ou seja, estas deixaram de comandar os destinos de Roma que passaram para as mãos de Octávio. Apesar das instituições republicanas terem continuado a existir durante o governo de Octávio, este tinha sempre a última palavra sobre os assuntos prioritários: política externa, administração das províncias, assuntos religiosos, etc. Podemos, sem dúvida, afirmar que o seu poder era de tipo absoluto, observando, controlando e comando tudo e todos.



A chave do seu poder residiu num exército fiel, capaz de fortalecer o Estado, ainda que este recurso tenha acabado por gerar um regime militarista. Octávio, formalmente, nunca se proclamou imperador. Assim, durante largos anos ostentou apenas os títulos de cônsul e tribuno, não havendo, contudo, dúvidas de que o seu poder era virtualmente ilimitado. Mais tarde, assumiria também a direcção do culto religioso romano. O Senado concedeu-lhe o título de “Augustus”, cognome religioso que consagrava a sua missão como divina, até ai reservado apenas às divindades.



Enquanto os seus generais iam alargando os limites territoriais do império, Augusto consolidava o poder central e a administração no que dizia respeito ao emprego dos funcionários, à cobrança de impostos, à emissão de moeda e à manutenção da ordem pela frota e pelas legiões romanas. Desta forma, o exercício do poder absoluto de Augusto coincidiria com uma época de paz e estabilidade interna no Império, a chamada pax romana, época bem diferente do período conturbado das guerras civis que a precederam. Este período ficou conhecido como época áurea do Império, em virtude da ordem social estabelecida e da extensão territorial alcançada.



Assim, durante o seu governo, apoiado num grupo de fiéis amigos – Agripa e Mecenas -, aumentou o Império, consolidou as fronteiras, pacificou as províncias pela imposição da paz romana, reformulou o aparelho administrativo, reestruturou a sociedade em classes censitárias (com base no dinheiro que possuíam), restabeleceu a religião tradicional, restaurou e construiu inúmeros templos, cúrias, teatros, termas, pontes, aquedutos e estradas por todo o Império, rodeou-se de poetas, escritores e artistas como Tito Lívio, Horácio e Virgílio, gabando-se, quanto a Roma, de ter encontrado uma cidade de tijolo e a ter deixado de mármore.