Pritzker 2012 para Wang Shu é um sinal para o futuro da arquitectura na China

Wang Shu
Pouco conhecido fora do seu país, Wang Shu mostra com a sua obra que o que se constrói na China "é mais do que a produção em massa da banalidade", diz um dos membros do júri.
O prémio Pritzker 2012 foi atribuído a uma obra que "abre novos horizontes ao mesmo tempo que ressoa com o lugar e a memória" - foi com estas palavras que o júri daquele que é considerado o Nobel da arquitectura justificou ontem a escolha este ano do arquitecto chinês Wang Shu.
 
Jovem, com apenas 48 anos, e com obra construída unicamente na China, Wang Shu - que fundou com a sua mulher, Lu Wenyu, o atelier Amateur Architecture Studio - é um arquitecto relativamente pouco conhecido fora do seu país. 
Museu de História de Ningbo, 2003-2008Lv Hengzhong

"É bastante inesperado", comenta Ricardo Carvalho, crítico de arquitectura do PÚBLICO. Mas, lembra, "também Eduardo Souto de Moura [o arquitecto português que recebeu o Pritzker de 2011] era conhecido apenas num certo meio, entre arquitectos, e Wang Shu tem um pouco o mesmo perfil. São prémios a falar de uma outra visão sobre o mundo, de uma qualidade local e não necessariamente que sirva a qualquer lugar."

Trata-se de um prémio que "tem claramente a ver com o momento chinês", e que é, ao mesmo tempo, "uma crítica a esse momento". Isto porque, quando se olha para a obra de Wang Shu, percebe-se claramente que "no contexto chinês ela é muito diferente da espectacularidade e do kitsch" de muito do que se tem construído naquele país, "é muito mais arcaica, com a ambição de ser perene".
 
Biblioteca da Faculdade de Wenzheng, 1999-2000Lu Wenyu

O júri do Pritzker - presidido por lorde Palumbo e que integrava, entre outros, o arquitecto chileno Alejandro Aravena, o chinês Yung Ho Chang, a britânica Zaha Hadid, Pritzker de 2004, e o australiano Glenn Murcutt, Pritzker 2002 - assume isso mesmo: "O facto de ter sido escolhido um arquitecto chinês supõe um importante passo no reconhecimento do papel que a China vai desempenhar no desenvolvimento dos ideais arquitectónicos. Além disso, o êxito do urbanismo chinês nas próximas décadas será importante não só para a China mas para o mundo inteiro."

Aravena di-lo claramente: "Há questões significativas ligadas ao recente processo de urbanização na China - se deve ser ancorado na tradição ou se deve olhar para o futuro. Como em qualquer grande arquitectura, o trabalho de Wang Shu consegue transcender esse debate produzindo arquitectura que é intemporal, profundamente enraizada no seu contexto e no entanto universal." E Yung Ho Chang reforça a mesma ideia ao afirmar que a obra de Wang "mostra que a arquitectura na China é mais do que a produção em massa da banalidade que responde ao mercado e de reproduções do exótico."

Museu de História de Ningbo, 2003-2008DR
Para se conhecer a arquitectura de Wang Shu é necessário ir à China e, sobretudo, à região de Hangzhou, onde está a maioria dos trabalhos - entre os mais conhecidos conta-se o Museu Histórico de Ningbo, um edifício em pedra, com pequenas aberturas rasgadas de forma incerta, e uma estrutura "quebrada" em vários pontos. É um edifício com "uma dupla condição", descreve Ricardo Carvalho. "Tem formas perfeitas mas ao mesmo tempo parece quase inacabado." 

Pavilhão Ningbo Tengtou, Expo de Xangai, 2010Lu Wenyu

Trabalho artesanal
Autor dos pavilhões da China na Expo de Xangai e na Bienal de Veneza de 2006, Wang Shu fez vários edifícios públicos, entre os quais o Campus Xiangshan da Academia Chinesa de Arte, mas também as delicadas casas sobre água conhecidas como Five Scattered Houses, em Ningbo.

Wang Shu tem uma relação muito próxima com o trabalho dos artesãos. Nascido em 1963 em Urumqi, na província de Xinjiang, filho de um músico e carpinteiro amador e de uma professora, parecia destinado a ser artista plástico ou escritor. Mas os pais aconselharam-no a estudar ciências ou engenharia e ele optou por uma via intermédia - a arquitectura. Depois de se formar, foi trabalhar, no início dos anos 90, com artesãos e construtores para aprender tudo sobre técnicas de construção, sobretudo na recuperação de casas antigas.