Congresso Europa Nostra | 28 prémios para o património europeu porque “é mais fácil amar o que é belo”
À entrada do Museu do Oriente, em Lisboa, há uma fila de autocarros
que não é habitual. Deles saem os participantes do Congresso Europa Nostra, a
federação pan-europeia de património cultural que reúne 250 organizações
não-governamentais e outras sem fins lucrativos, com mais de cinco milhões de
associados, que começou quarta-feira em Lisboa.
A manhã foi dedicada à apresentação dos 28 projectos que receberam os prémios
da edição deste ano nas áreas da conservação, do serviço à comunidade, da
sensibilização da opinião pública/educação e da pesquisa científica. A
diversidade é grande, já que uma das preocupações do júri, explicou John Sell,
vice-presidente executivo da Europa Nostra, no início da sessão, é mostrar que
“a excelência pode assumir muitas formas quando se fala de património”.
Mosteiro de Santa Clara-a-Velha. Coimbra |
Basta percorrer a lista dos projectos para constatar que Sell tem razão. Há
arqueologia, monumentos do tempo de Augusto (século I a.C.) vistos à lupa,
fortificações do século XVIII, centrais térmicas dos anos 1920, programas
educativos que transformam crianças e jovens entre os sete e os 18 anos em
voluntários do património no norte da Europa, colégios reais que misturam a
herança cultural de dois países (Espanha e Itália), edifícios centenários que
tiveram vários usos e hoje foram devolvidos à comunidade e até projectos de
engenharia que querem diminuir os efeitos de um possível sismo num mosteiro da
Roménia.
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Museu da Presidência da Republica. Lisboa |
Portugal, que já foi três vezes distinguido pela Europa Nostra em edições
anteriores (Museu da Presidência da República, Mosteiro de Santa Clara e
reabilitação da Via Latina), está duas vezes representado na lista dos
premiados desta edição, com projectos na área da conservação em Mafra e
Amesterdão. Como? A Holanda candidatou a reabilitação do complexo da Sinagoga
Portuguesa de Amesterdão (século XVII), Portugal o restauro dos órgãos do convento
de D. João V (século XVIII).
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Sinagoga Portuguesa de Amesterdão |
Dois exemplos
Fundada em 1675, esta sinagoga de Amesterdão foi a maior do mundo até ao século
XIX, explicou aos participantes do congresso Judith Belinfante, membro da
fundação para a preservação do património da comunidade judaica portuguesa da
cidade, traçando um percurso pelas várias fases de restauro que o edifício,
monumento nacional desde os anos 1920, atravessou nos últimos 60 anos. A
última, executada entre 2009 e 2011 com apoios públicos e privados, foi a que
“devolveu verdadeiramente a sinagoga aos visitantes de Amesterdão”. Com a
biblioteca israelita que faz parte do complexo e com o Museu de História
Judaica que fica do outro lado da rua, a sinagoga forma uma espécie de centro
da comunidade, que começa a abrir-se cada vez mais ao exterior. Em 2011 foi
visitado por 53 mil pessoas e este ano esse número foi atingido no final de
Abril.
“A sinagoga e o resto do complexo são muito importantes para a comunidade”,
disse ainda Judith Belinfante, “pela importância história, pela beleza do
edifício, mas também pelas suas colecções”: 800 objectos em prata, ouro e
têxteis destinados aos rituais a que se juntam mais de 30 mil livros e 500
manuscritos, desde obras religiosas a textos usados no estudo da medicina e na
prática do comércio.
A sinagoga foi construída pelos judeus sefarditas da cidade (os de origem
ibérica), que ali se refugiaram depois de serem expulsos de Espanha e para
evitar a conversão obrigatória ao catolicismo decretada pelo rei D. Manuel.
Escapou à destruição ordenada pelos nazis na Segunda Guerra Mundial e funciona
ainda hoje no mesmo edifício e sem instalação eléctrica, “para a manter o mais
próximo possível da sua condição original”.